Que horas ela volta? (filme)

Regina Casé encabeça o elenco dessa filme escrito e dirigido por Anna Muylaert. E isso, para mim, era o grande motivo de não ir ao cinema. Mas nas últimas semanas, o filme começou a ganhar grandes proporções com sua indicação como representante brasileiro a possível concorrente na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2016 e estar com uma forte campanha nos Estados Unidos, com alguns críticos de lá colocando-o entre os favoritos mesmo. Além disso, li diversas críticas elogiando a performance de Regina Casé que levou o prêmio de melhor atriz dramática (junto com Camila Márdila, que interpreta sua filha) no festival de Sundance e com uma forte campanha da produtora de indica-la também ao Oscar. Com todo esse burburinho, me rendi e fui conferir o filme.

Interpretar personagens que enfrentam situações crônicas é uma tarefa fácil. Difícil é interpretar a personagem comum. Veja o exemplo de Grazi Massafera na atual novela “verdades Secretas”. Receber elogios por interpretar uma viciada em crack que é violentada na rua é muito fácil, pois independente de sua atuação, a cena por si só fala muito, qualquer ator regular consegue manter a tensão necessária. Dar vida a uma personagem tão comum em nossa sociedade – a empregada retirante vinda do Nordeste – é dificílimo. Dar credibilidade a alguém tão comum, agir com a naturalidade necessária nas situações mais comuns não é tarefa simples. Regina Casé realmente surpreende com o trabalho de corpo, na forma de andar, os olhares, as frases mal construídas, a timidez, a submissão. Incrível trabalho mesmo.

Val (Regina Casé) é empregada na casa de Barbara (Karine Teles) e Carlos (Lourenço Mutarelli), onde trabalha há anos, cuidando não só dos afazeres do lar mas também como babá de Fabinho (Michel Joelsas), a quem cuida desde seus 6/7 anos de idade. Para trabalhar na casa de família, a pernambucana teve de deixar sua filha Jéssica (Camila Márdila) sob os cuidados da avó em Recife. Há muitos anos que não consegue ir visitar a família e a menina nem fala mais com ela. Até que um dia, Jéssica liga e avisa que está indo para São Paulo para fazer o vestibular. A chegada da jovem na casa dos patrões de Val afetam toda a rotina. Ela chega criticando toda a relação empregado-patrão estabelecida de forma silenciosa e sem regras ditadas que existe no local. Ela encanta Carlos e irrita Barbara, além de preocupar sua mãe com suas atitudes.

Entendi o porque do rebuliço sobre o filme. Ele incomoda. Anna Muylaert  transporta para a telona a dinâmica preconceituosa e exploradora da relação patrão-bonzinho-empregada-submissa que reina no Brasil. Um tipo de relação que só existe aqui, tão enraizada que nem percebemos o quão humilhante é para as domésticas. Mas também mostra que muitas vezes são elas quem criam essa atmosfera de submissão, de medo dos patrões. A ausência de diálogo nessa relação faz com que se criem dois mundos debaixo de um mesmo teto. As babás e empregadas acabam muitas vezes assumindo o papel de mãe (e o filme, em alguns países teve o título de “A Segunda Mãe”) dos filhos da patroa e as patroas nem percebem.  Quando alguém com uma visão “de fora” olha para isso e questiona, faz comentários e críticas é que ambos os lados param para ver o que existe ali. E esse é o papel de Jéssica na história. Muito bom.

Só um ponto no enredo não me agradou que é a forma como Carlos se envolve com Jéssica. Achei um pouco forçado e desnecessário para o enredo. Mas isso não estraga o filme. Nem mesmo a atuação fraca de Loureço. O filme é bom! Vale a pena conferir. E, claro, tem minha torcida para a premiação da Academia de Hollywood, pois sou brasileiro, cafona e torço por nós sempre, mesmo tendo que torcer por Regina, que não me agrada nem um pouco (como pessoa).

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